Patrícia Lima
Pense num estado que combina duas palavras: ‘inteiramente’ e ‘satisfação’. Isso é a postura de um yogue que realizou santosha: viver completamente satisfeito, num estado de contentamento. Mas como é possível alguém viver o tempo todo nesse estado? Isso já nos soa como um estado de nirvana, de iluminação.
Santosha faz parte dos Niyamas (as ações necessárias que o yogue deve fazer para seguir o caminho do yoga: sauca,limpeza; tapas, disciplina; svadhyaya, estudo e ísvarapranidhana, entrega). E os niyamas são ações, atitudes, posturas do yogue diante da vida. Esse contentamento não surge espontaneamente. É um exercício diário de olhar ao nosso redor com a intenção de nos regozijar pelo que nós temos.
E isso vai além das coisas materiais, como conforto, saúde, possibilidades de crescimento, perdas e insucessos. Além disso, o contentamento é muito mais abrangente, é saber que estamos fazendo o melhor e recebendo o resultado das nossas ações com aceitação. A partir dessa aceitação, nos sentimos mais responsáveis, e não culpados pelas nossas ações de uma maneira a gerar contentamento com a nossa vida e tudo que nos envolve. É um estado interior onde a mente além de satisfeita com as situações externas sejam elas boas ou não, é também uma mente completamente alegre, consciente de suas responsabilidades, habilidades e limitações.
Não engloba a cobiça, o desejo desenfreado que nos tira do aqui e do agora. Mas também não é uma situação de apatia, lembrando que faz parte das cinco ações dos niyamas citadas acima. É uma virtude a ser cultivada a partir da percepção do nosso estado real no presente, de saber em que ponto nos encontramos para, a partir daí, fazer os devidos movimentos possíveis para o objetivo que se deseja. É aprender a apreciar e receber o que se tem agora e isso nos liberta de qualquer servidão ao consumo. Basta contemplar o que realmente nos faz feliz e veremos que necessitamos de muito pouco, o necessário para a vida.
Descobriremos a satisfação surgir no nosso trabalho e nos nossos relacionamentos quando praticamos santosha. E é de santosha que nasce a maturidade para a realização dos nossos projetos substanciais. Surge a clareza necessária na mente e dela vem as ações para sua execução. A prática de santosha em si é muito simples, você nem necessita de posses para desenvolver esse tão sonhado contentamento. Basta olhar para o corpo e contemplar cada parte.
Você pode começar visualizando e sentindo os dedos dos pés e as pernas que nos levam aonde queremos, com tudo funcionando perfeitamente bem. A conexão dos membros inferiores com a pelve que nos dá essa liberdade de ir e vir sem auxílio de nenhuma cadeira de rodas ou bengalas. O tronco com todos os órgãos e sistemas em plena atividade, sem auxílio de sequer nenhum aparelho respiratório para nos manter vivos. As mãos e braços nos possibilitando a apreensão, a possibilidade de abraçar alguém que amamos! O pescoço perfeito, a cabeça e cérebro funcionando bem. Ouvir, sentir cheiros, provar sabores e ver o mundo à nossa volta, com suas cores, belezas e horrores. E se te falta a visão, use a sua imaginação e demais sentidos que são apuradíssimos. Você ainda os tem! Se você ainda não se aproximou desse contentamento, para um pouco de respirar, faça uma apneia bem curta e, na próxima respiração sinta o seu corpo se nutrir dessa energia plena que vem com a sua respiração. Sinta o seu corpo sendo preenchido por aquilo que lhe é sagrado, o ar que você respira, a nutrição pioneira para ele. Santosha é uma das portas que nos proporciona esse encontro com a gente mesmo. Requer treino como qualquer outra ação presente nos niyamas, mas seus frutos preparam o terreno para que o estado de yoga surja na nossa mente.