Patrícia Lima
Limpeza e purificação são sinônimas de sauca. O primeiro dos niyamas (segundo estágio de yoga que são as observações que devemos ter para conosco) é a ‘faxina’ necessária para a edificação do caminho do yoga. Quando mudamos de casa a primeira ação antes de levar a mudança em si é limpar a casa nova. E não basta uma limpeza como de costume, é necessário uma faxina bem profunda como a assepsia de vasos sanitários, banheiras e afins. Outro aspecto importante da limpeza é vasculhar tudo aquilo da antiga casa que não vai nos servir mais e descartar. Gostamos de reciclar porque isso nos proporciona mais energia.
Ao decidirmos pelo caminho do yoga, a limpeza é muito importante. Do grosseiro para o sutil, todos os nossos aspectos devem ser purificados. No corpo físico, antes de praticarmos ásanas,(as posturas de yoga) é importante tomar um banho para nos sentirmos literalmente limpos. Provavelmente a prática pode gerar suor que também faz parte dessa purificação de toxinas. A limpeza nas camadas mais sutis de nós mesmos começa ainda nos ásanas, principalmente nos vayus (canais energéticos) e cakras (centros de energia). As posturas proporcionam espaço no corpo físico, e, consequentemente afetam positivamente o corpo sutil.
Através desse espaço alcançado, os pranayamas, que são os exercícios respiratórios, atuam no corpo sutil para dissolver a estagnação de energia. Isso gera grande expansão de energia nova no corpo e também na mente. Ficamos mais hábeis em manter o foco, nos sentindo mais presentes e capazes de olhar o que se passa na mente para detectar possíveis focos de impurezas sutis, como pensamentos recorrentes, pensamentos negativos, discurso interno, visões confusas, memórias, fantasias e outras perturbações. Isso é a parte da limpeza que tem a ver com o ‘vasculhar’. Precisamos dessa disciplina do olhar para a mente descartar o que for possível na sua raiz. Isso além do contexto da prática na sala de yoga. Se deixarmos os pensamentos se instalarem na mente pode gerar emoções arraigadas que necessitará de uma depuração mais elaborada e consistente.
Sauca é a prática de tornar-se apurado, dia a dia, constantemente. Um dos maiores obstáculos ao desenvolvimento do autoconhecimento é o nosso ego. E às vezes a presença de nossa ‘visão de mundo’, que inclui os nossos aprendizados anteriores, e o nosso planejamento de ação para começar o caminho de yoga é entendido como um processo de racionalização puro e simplesmente. O Yoga diz que não, o discernimento em conjunto com a contemplação nos leva a descobertas de nós mesmos nunca antes imaginado.
Os oito estágios do yoga não são uma receita de bolo. Aliás, toda receita tem as suas peculiaridades. Um bom cozinheiro sabe que a excelência vem da prática constante. Então não teremos sucesso nesse caminho se não aplicarmos o discernimento o tempo todo, tanto com as dúvidas que surgem, os ganhos e os fracassos e, o mais importante, o que é necessário purificar em nos mesmos. Você deve pensar que o yoga também é como se olhar no espelho. E quando você se olha no ‘espelho’, enxerga o seu próprio reflexo, desde que o espelho esteja limpo. Esse é o trabalho mais importante: ‘limpar’ o espelho antes de tomar tudo o que vê como verdade. Se o que conseguirmos enxergar nos é apreciado demais, provavelmente estamos enxergando pela perspectiva do nosso ego.
Nessa ausência do autoconhecimento, o nosso ego toma o leme e as emoções auxiliam nessa tarefa de manter o barco à deriva. A consciência testemunha tem um papel importante como observadora dos pensamentos e emoções que surgem na mente, evitando qualquer apego e aversão; percebendo a fabricação de pensamentos e dissolvendo-a; percebendo o momento em que as emoções surgem como uma picada de cobra e evitando que esse veneno se espalhe.
Trazer essa consciência à tona é o trabalho de todos os praticantes para que a purificação realmente aconteça. Sauca nos purifica do autoelogio, afrouxa as rédeas da mente, dissolve as emoções, purifica a fala, o pensamento e as ações.